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A arte dos fritoleiros no Carnaval de Veneza

O Carnaval de Veneza é um rito e, por isso, não pode ser definido apenas como um evento social de prazer. Continua sendo uma reconstrução histórica, uma continuação natural da antiga tradição dos Doge e de seus súditos. Enfim, além dos milhões de pessoas que todos os anos lotam as praças e ruas da capital da República Sereníssima... o lançamento da Colombina no domingo anterior à quinta-feira gorda... as máscaras que alienavam as identidades e colocavam todos no mesmo nível... as lendas e verdades ligadas a histórias de amor que duraram apenas uma noite entre becos e ruelas frias e às vezes preenchidas por uma fina neblina invernal… além de tudo isso, o Carnaval de Veneza é o tempo mágico em que até a alma mais profunda da velha cidade do Leão revive a cada ano sem nunca perder seu brilho. 

Nesse contexto, retorna a arte dos fritoleiros. Quem eram? O nome fala por si. Trata-se de uma verdadeira corporação que permaneceu intacta até a queda da República Lagunar. Constituíram-se em uma associação por volta dos anos 1600, composta por setenta representantes, um de cada área onde podiam exercer a arte da fritura desse extraordinário produto. Nessa corporação, apenas os filhos dos fritoleiros podiam suceder seus pais e ter garantido o direito à venda. Os fritoleiros eram, portanto, uma verdadeira corporação com direitos e deveres e um registro no álbum das artes e ofícios, porque os Doges não deixavam escapar nenhum centavo de contribuição. 

Mas o que eram as frituras em Veneza? Não pensemos nas clássicas de forma redonda com variados recheios, desde passas até creme e quem mais as conhece e mais as coloca... A verdadeira fritoa veneziana era aquela que ainda hoje se chama elgalàn. Tinha uma forma que, após a fritura, deveria evocar o sol e a luz da cidade de São Marcos. Uma massa de ovo, farinha e açúcar, manteiga, uma pitada de anis ou grappa e uma pitada de sal. Essa era a receita histórica que, ainda hoje, as renomadas confeitarias venezianas repropõem após centenas de anos. 

A maestria do fritoleiro era a de esticar a massa com o rolo (o mattarello) até que a folha se tornasse quase um véu que deixava entrever a luz do outro lado. Depois, cortavam-se losangos ou tiras largas de 4-5 centímetros e longas de 2, praticando com a rueléta (rodinha) duas incisões oblíquas ao centro da massa. A fritura ocorria adequadamente durante o Carnaval, também porque se podia usar toda a banha que vinha da tradicional preparação do Porco em Santo António Abade. A banha era conservada em grandes tigelas de barro, vidro ou pedra e servia depois como gordura natural para a fritura. Uma vez lançadas nas grandes panelas sobre o fogo vivo, as tiras de massa engrossavam formando os típicos grostòli, ou seja, as bolhas que se formavam na superfície da massa durante o cozimento. A finalização era feita com um leve véu de açúcar. 

Essa antiga receita tem sido transmitida tal como é até hoje nas casas venezianas e hoje se tornou uma receita típica que cruzou o canal e contagiou toda a península. Além dos clássicos galàn que aqui contamos, havia também as frituras ou fritoe mais clássicas, produzidas com uma massa de farinha, leite, ovos e açúcar. Depois, adiciona-se passas, ou limão ou maçãs raladas. Neste ponto, adiciona-se uma pitada de fermento de cerveja e deixa-se levedar um pouco em temperatura morna. 

Uma vez, deixava-se perto da lareira ou do aquecedor (a stùa). Após a levedura, cerca de uma hora, pega-se o óleo ou a banha quente em uma panela e começa-se a preparar as frituras. Com uma colher, despeja-se diretamente no óleo uma colherada de massa e aguarda-se que ela arredonde, expanda e se torne uma pequena bola dourada e inchada. Também neste caso, podem-se polvilhar com um pouco de açúcar por cima. 

Por fim, permanecem as deliciosas faètes ou favettes que eram produzidas com a mesma massa dos galàn, que era deixada inteira e, em seguida, pequenos pedaços eram rolados entre as duas mãos e depois fritos diretamente no óleo ou na banha. Também neste caso, a finalização era feita com açúcar de confeiteiro por cima. As bolinhas tomavam uma forma esférica com uma pequena rachadura característica. 

A arte dos fritoleiros venezianos tem sido transmitida de geração em geração para todas as casas das gentes venezianas e não apenas. Algumas confeitarias ainda hoje permanecem fiéis à antiga receita Serenissima. A habilidade delas é fazer você respirar o aroma que invadia durante o período carnavalesco as ruas e canais da capital veneziana com doces e sobremesas artesanais típicos da época. Sabor bom que permaneceu fiel ao longo dos séculos. 

Bernardo Pasquali 

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